Muros pintados e um novo visual urbano: o graffiti em Salvador
- Ana Paula Medina, Gabriel Soares e Marcos Lopes
- 21 de set. de 2015
- 4 min de leitura
Por muito tempo marginalizado, outrora subnegado pela má fama da sua irmã, a pixação, o graffiti deu um salto esplendoroso quanto à subversão de valores associados a ele. Sua origem, ligada ao hip-hop e aos movimentos sociais, lhe confere um fardo de preconceitos e barreiras. Entretanto, a elaboração estética e o caráter comunicativo atribuem ao graffiti grande potencialidade, seja nos muros das metrópoles, ou em sofisticadas galerias.

Graffiti do músico e artista Fael Primeiro. Crédito: Blog Andrea Velame
"O graffiti hoje é parte da cidade de Salvador". Foi com esta frase que a jornalista e fotógrafa, Carol Garcia, iniciou a sua definição sobre a relação entre a capital baiana e este formato expressivo de arte, em entrevista à Mochila Baiana. Em autoria conjunta com a antropóloga Bárbara Falcón, Carol lançou o livro Graffiti Salvador há aproximadamente um ano, obra que traz o perfil de 28 grafiteiros da capital baiana e mais de 300 fotos dos trabalhos expostos nas ruas soteropolitanas. A ponto de render um livro de mais de 180 páginas, fica evidente que o graffiti em Salvador não é uma atitude efêmera, mas sim uma realidade constante e crescente, responsável por colorir a cidade e dar voz àqueles que "só" têm os muros para se expressar.
Uma vez que é característico do graffiti "gritar" determinadas realidades e reflexões através das pinturas, Salvador se torna prato cheio para exploração dos grafiteiros, já que a cidade propõe fatores específicos da sua formação, diferenciando-a de outras metrópoles e possibilitando uma nova roupagem à arte. "Acho que o graffiti daqui é peculiar, sim. Temas ligados à questão da ancestralidade africana, por exemplo, são muito marcantes por aqui", complementou a fotojornalista, Carol Garcia.

As grafiteiras Rebeca Lawinsky e Sista Katia, mostrando que a arte também tem uma realidade ampliada para a questão de gênero. Crédito: Carol Garcia
Já para Elton Bandeira, ou Octo (nome artístico), grafiteiro em Salvador e graduado em Artes pela Universidade Católica de Salvador (Ucsal), as características determinantes estão mais associadas ao artista do que à sua localidade. Em entrevista à Mochila, Octo explicou “que não existem características "territoriais" e sim pessoais. Você não identifica um trabalho pela cidade na qual ele está e sim pelos traços característicos de cada artista. Ou pela sua "tag" (assinatura), que muitas vezes deixa de ser um nome pra ser um símbolo”.
Questionado sobre a possível perda de identidade do graffiti, quando exposto em galerias de artes e muros de empresas, Elton Bandeira é categórico e defende a rua como plataforma universal de divulgação desta arte. “Eu faço arte como protesto (pixo) e com cunho artístico (graffiti), (...) acredito que meu graffiti é para pessoas que não andam em galerias. Quem anda em galerias passa pelas ruas. Logo, na rua eu dou acesso a TODOS, sem cobrar nada, e na galeria eu vou limitar quem ver e certamente vou querer vender aquele trabalho”, pontuou. O artista atribui a ascensão da expressão grafiteira como fruto da mudança de postura dos artistas e pela visibilidade que a mídia passou a dar à arte, que já aparece em painéis de estúdios e aberturas de novela.

Trabalho feito por Elton Bandeira (Octo), no Centro da cidade de Salvador. Crédito: Elton Bandeira
Inserção
Com tamanha representatividade, o graffiti invandiu os muros e paredes de grandes empresas em Salvador, sendo este mais um sinal da boa relação da população local com a arte. Para empresas como a Share Social Media, que trabalha diretamente com o processo criativo e disponibilizou a sua fachada para o deleite de grafiteiros, esta relação é contínua e harmoniosa, uma vez que parcerias e projetos conjuntos já fazem parte da linha de trabalho desenvolvido por ambos. "Por acreditar no graffiti desde o início, a gente vê essa abertura como uma forma de incentivar o trabalho deles, uma arte que vem da rua e com muito bom gosto. A jovialidade que a nossa empresa transmite também está relacionada com a nossa escolha, uma vez que o graffiti dialoga positivamente com as pessoas que têm contato direto com a marca", explicou Luan Nunes, sócio da Share, à Mochila Baiana.
No ano de 2005, a Prefeitura de Salvador, até então gerida por João Henrique, fomentou o Projeto Salvador Grafita, que estimulava a pintura de passarelas, viadutos, escolas e demais órgãos municipais, a fim de proporcionar arte na cidade e incentivar a prática. Já na segunda gestão de João Henrique o Projeto perdeu forças, sendo extinto ainda antes do fim do mandato.
Arte do Bem
O artista plástico Denis Senna transcendeu à prática de pinturas e resolveu misturar a arte com a educação, a partir do graffiti. Ele desenvolve, em uma escola municipal do Cabula I, oficinas para crianças e jovens que têm interesse em mergulhar no universo da cultura urbana, trabalhando bases práticas da arte de grafitar. Assista, clicando no link abaixo, a entrevista que Denis Senna concedeu à repórter da Mochila Baiana, Ana Paula Medina, contando mais detalhes sobre o Projeto e relatando o envolvimento das crianças.
Catálogo de Áudios
Assista ao vídeo elaborado por um coletivo de audiovisual de Salvador, mostrando a montagem de um painel pelos grafiteiros Bigode, Eder Muniz, Lee 27 With e Raimundo Bida
Confira o documentário produzido em Salvador sobre o perfil de um dos mais divulgadores do graffiti baiano no mundo, Eder Muniz
Comentários